Thursday, September 9, 2010

Outono cá dentro

Ouço as folhas que se arrastam pelo chão. Vejo as árvores que balançam lá fora, ao sabor do vento agreste. Vejo as nuvens que se amontoam e empurram no mesmo espaço. Nada parece fazer sentido. Parece-me tudo um filme de terceira categoria ao qual não me apetece assistir. Um filme com som, mas que me parece mudo, como os do Charlie Chaplin. Bons tempos esses...em que era capaz de me divertir a ver um filme a preto e branco e sem som...
Eu não sou mais eu. Alguém se usurpou do meu corpo enquanto fico a observar de fora. Os meus movimentos são demasiado automáticos para me aperceber do que estou a fazer, ou para onde estou a caminhar. Sinto apenas que tenho que fazer alguma coisa, mexer-me. Não posso tornar-me num vegetal ou num zombie... E sei que não posso nem devo pensar. E esvaziar a mente é das piores tarefas...

Tuesday, September 7, 2010

O elo

Senti finalmente que o elo se quebrou. Quebrou-se em mil bocados que nunca, jamais poderão ser colados.

Serei mais eu amanhã, não serei moldada nem acusada. Serei feliz.

Friday, September 3, 2010

Poema da Despedida

Não saberei nunca dizer adeus.

Afinal, só os mortos sabem morrer.

Resta ainda tudo,
só nós não podemos ser

Talvez o amor,
neste tempo,
seja ainda cedo.

Não é este sossego
que eu queria,
este exílio de tudo,
esta solidão de todos.

Agora
não resta de mim o que seja meu
e quando tento
o magro invento de um sonho
todo o inferno me vem à boca

Nenhuma palavra
alcança o mundo, eu sei
Ainda assim,
escrevo.

Mia Couto